Controle orbital e de atitude


Controle orbital

Autoria: Norma T. O. Reis

O lançamento do veículo espacial até que ele atinja a órbita da Terra ou de outro planeta é somente o início de uma jornada. Veja abaixo a inserção da sonda Messenger na órbita de Mercúrio e preste atenção nas características do veículo espacial, nas manobras, nos propulsores e na trajetória percorrida antes da inserção orbital.

Há um complexo trabalho posterior de controle a fim de que ele cumpra a missão para a qual foi projetado. Esse controle compreende:

  • Navegação: onde estou? Informa e prevê (estima) a posição e velocidade (ou elementos orbitais) do veículo no espaço, que é sua determinação da órbita;
  • Trajetória: para onde estou indo? Comandos que acionam propulsores, que por sua vez alteram a velocidade do veículo espacial, para controlar sua trajetória ou órbita, com base em dados de navegação.

 O sistema de navegação é responsáveis por conduzir o veículo espacial para onde queremos levá-lo. Em outras palavras, ao lançar um veículo espacial é necessário que controlar elementos de navegação, a fim de assegurar de que ele se encontre na posição, velocidade e trajetória corretas.

 As exigências de controle orbital estão diretamente relacionadas às caractetísticas da missão, tais como:

  • Tipo de órbita;
  • Demandas de estabilidade;
  • Exigência de mudanças orbitais;
  • Vida útil;
  • Sistemas de navegação a bordo;
  • Local para onde o satélite deve apontar;
  • Manobras exigidas;
  • Presença de antenas que devem ficar apontadas em uma dada direção;
  • Painéis solares que devem ficar apontados na direção do Sol.

Por exemplo, imaginemos uma sonda a caminho de um planeta distante, assim como a Cassini-Huygens da NASA, por exemplo, que foi enviada para estudar Saturno e seu satélite Titã. Um veículo espacial a caminho de um planeta distante está na verdade em órbita do Sol, e o espaço entre sua órbita solar e sua órbita de destino é denominado a trajetória daquele veículo espacial.

Para determinar uma órbita, é necessário identificar os elementos orbitais do veículo espacial, e calcular as perturbações em sua órbita natural. Para controlar a trajetória de um veículo espacial é necessário comandar seu sistema de propulsão, para alterar sua velocidade. Informações sobre a velocidade do veículo espacial e sobre a órbita de destino servem de base para determinar quais alterações de velocidade serão necessárias.

Modelos matemáticos e simulações

O sistema emprega modelos matemáticos e simulações de computador para o controle do veículo espacial. Eles são utilizados nos serviços de controle de navegação e órbita de um veículo espacial. Esses modelos mostram a história de navegação do veículo espacial. Há alguns parâmetros orbitais e movimentos das Terra bem conhecidos. As medições significativas que podemos obter a partir da Terra do movimento do veículo espacial são:

  • Sua distância ou alcance da Terra;
  • O componente de sua velocidade que é direcionado à Terra ou para fora da Terra, e
  • Sua posição no firmamento da Terra.
Alguns veículos espaciais podem gerar um quarto tipo de dado de navegação,
  • Navegação ótica, enquanto o veículo espacial utiliza seus instrumentos de imageamento para apontar para um planeta ou corpo celeste contra as estrelas de fundo.

Ao adquirir repetidamente esses três ou quatro tipos de dados, um modelo matemático pode ser construído e mantido descrevendo a história da localização de um veículo espacial no espaço tridimensional ao longo do tempo. A história da navegação de um veículo espacial está incorporada não somente no planejamento de suas futuras manobras, mas também na reconstrução de suas observações de um planeta ou corpo que ele encontrar. Isso é essencial por exemplo na detecção da passagem do veículo espacial através de magnetosferas e anéis planetários, bem como para interpretar resultados de imagens.

Outro uso de dados de navegação é a criação de previsões, que são conjuntos de dados que preveem a localização no céu e as frequências de rádio utilizada no rastreamento do veículo espacial. Quer ver como isso funciona na prática? Ao terminar de ler esse material, acesse esse site  (conteúdo em inglês) e simule sua própria viagem espacial: http://orbit.medphys.ucl.ac.uk/

Estabilização de veículos espaciais

Além de controlar a posição e a trajetória do veículo espacial, é necessário controlar sua atitude, ou seja, a direção na qual ele permanece apontado no espaço. O controle de atitude estabiliza o veículo espacial e o orienta nas direções desejadas durante a missão, independente de perturbações externas nele atuantes. Cada tipo de missão demandará tipos diferentes de controle de atitude, ou seja, estabilização.

Assim, pode ser desejável que um satélite de sensoriamento remoto permaneça o tempo todo apontado para uma única região na superfície terrestre, caso o objetivo seja observar o desmatamento, mudanças climáticas, dentre outros elementos que sofrem alterações mais ou menos lentas ao longo do tempo. Entretanto, uma sonda espacial a caminho de um planeta distante precisará alterar sua atitude diversas vezes, em função do tipo de dado que se pretende coletar em cada fase. Assim, propulsores a bordo do veículo espacial permitirão as manobras necessárias para que ele atinja a atitude desejada. Vejamos na sequência os principais tipos de estabilização.

Estabilização spin: O satélite tem formato cilíndrico e gira ao redor de seu próprio eixo.  É  uma forma muito simples de manter o veículo espacial em uma determinada direção. Veja na ilustração abaixo o satélite geossíncrono de comunicação, da China (Extraído de http://www.astronautix.com/craft/fy2.htm).

Spin único: o veículo espacial como um todo gira.

Spin duplo: parte do veículo espacial gira, e parte se mantém estável na direção contrária à da rotação. Esse tipo de satélite possui uma seção giratória sobre a qual os painéis solares são montados e uma seção que aponta de forma estável na mesma direção o tempo todo, onde as antenas de comunicações são montadas. A seção giratória fornece estabilização básica e pode rotacionar. A seção estável também rotaciona, apesar de muito mais lentamente, em cerca de uma rotação por órbita – mantendo as antenas apontadas para a Terra. Equipamentos em uma plataforma estável apontarão na mesma direção o tempo todo, independentemente da rotação do satélite. Esse tipo de estrutura é simples, possui pequena capacidade energética e não possui painéis solares ou outras partes. Logo, requer grandes quantidades de bateria.

 Estabilização em três eixos: o veículo espacial tem amplas possibilidades de movimento e manobras.Veja na imagem abaixo o satélite sino-brasileiro de coleta de dados (CBERS), que coleta dados de sensoriamento remoto e foi desenvolvido em uma parceria Brasil-China (Extraído de http://www.cbers.inpe.br/?content=descricao1e2e2b). Mais informações sobre o satélite disponíveis em http://www.cbers.inpe.br/?content=descricao1e2e2b

Ativa: a atitude do veículo espacial é mantida através do uso de rodas de momento ou giroscópios de controle de momento. O veículo rotaciona uma vez por órbita, mantendo as antenas apontadas para a Terra. Os painéis solares são montados em estruturas que também rotacionam uma vez por dia para mantê-los apontados na direção do Sol. Nesta forma de estabilização, um sistema de controle a bordo mantém constantemente a orientação desejada. O sistema possui sensores, que medem a orientação, atuadores capazes de gerar torques e uma eletrônica computadorizada que calcula qual deve ser a atuação em função do erro apresentado na orientação.  Por exemplo, se os sensores do satélite detectarem que ele está se desviando de sua trajetória, suas rodas de reação aumentarão ou reduzirão a velocidade do veículo para que o satélite retorne à sua posição correta. Há um sistema de coordenadas relacionadas à estabilização em três eixos:  x (direção do voo), y e z. Assim, visivelmente uma maior quantidade de movimentação e manobras é possível, em comparação aos satélites de estabilização spin.


 Passiva: há basicamente dois tipos, a saber, gradiente de gravidade, baseado na tendência de um corpo se alinhar com seu eixo maior (aquele com o menor momento de inércia), geralmente utilizado com grandes estruturas; se o satélite possuir uma dimensão (comprimento) muito maior do que as outras duas (largura e altura), então surge um conjugado devido à diferença da aceleração da gravidade terrestre ao longo do comprimento, pois a gravidade diminui com o aumento da distância em relação ao centro da Terra. O torque de gradiente de gravidade faz com que o movimento do satélite seja semelhante ao de um pêndulo, que tende a se alinhar com a vertical. Outro exemplo é a estabilização geomagnética, que utiliza torque produzido por momento dipolo a bordo do veículo espacial, com o campo magnético da Terra.

Em ambos os casos – spin e três eixos – o eixo de rotação do satélite é perpendicular a seu plano orbital – o qual para órbitas geoestacionárias é o plano equatorial. Durante a fase de apontamento inicial, pode acontecer de o satélite girar de forma descontrolada. Deve-se então reduzir a velocidade, apontando o veículo espacial em seguida na direção correta. Acesse nesse site (http://www2.dem.inpe.br/val/projetos/atdyn/index.html) várias simulações dessas formas de estabilização, além de outras informações sobre estabilização de veículos espaciais.Veja na ilustração abaixo um satélite estabilizado em três eixos (Extraído de material didático da Universidade Internacional do Espaço – ISU: www.isunet.edu).

Os métodos de controle de atitude podem ser denominados aberto ou fechado. No método aberto, não ocorre retorno dos sensores e no método fechado, informações enviadas pelos sensores são utilizadas para controlar o veículo espacial. Um exemplo de método de controle aberto é o lançamento de um foguete ou o arremesso de uma bola; exemplos de método de controle fechado é um termostato e o piloto automático de um avião.

RESUMO DE MÉTODOS DE CONTROLE DE ATITUDE

Tipo Opções de apontamento Manobras Precisão Típica Limites de Vida Útil
Gradiente de gravidade Vertical da Terra somente Muito limitado ~ 5 graus (2 eixos) Nenhum
Magnético passivo Norte-sul somente Muito limitado ~ 5 graus (3 eixos) Nenhum
Spin único Fixado inercialmente qualquer direção Elevado uso de propelente para movimento ~ 0.1-1 grau em 2 eixos Propelente
Spin duplo Limitado somente por articulações na plataforma estável Elevado uso de propelente para movimento ~ 0.1-1 grau em 2 eixos Propelente
Três eixos Sem restrições Sem restrições/ Altos índices possíveis ~ 0.001 – 1 grau Propelente

Em síntese, o sistema de controle de atitude deve fornecer estabilidade. A precisão de apontamento é o principal determinante no desempenho de um sistema de controle de atitude. Confira esse vídeo que traz imagens de diversos satélites de observação da Terra. Preste atenção à sua engenharia: eles usam estabilização spin ou de três eixos? Por quê?


Sensores e atuadores

Há diversos elementos que perturbam o voo de um veículo espacial, tais como gradiente de gravidade, radiação solar, campos magnéticos e aerodinâmica. Vejamos no vídeo abaixo (conteúdo em inglês) como a radiação solar exerce pressão sobre veículos espaciais em órbita da Terra, alterando sua órbita. O efeito dessa radiação é diretamente proporcional à área do veículo espacial, e inversamente proporcional à sua massa. Um exemplo do efeito da pressão da radiação solar sobre a órbita de um veículo espacial é aumentar a excentricidade de sua órbita (ela se torna mais elíptica), aumentando o apogeu e reduzindo o perigeu.

Por isso, utilizamos sensores para detectam a posição e a aceleração do veículo espacial, que utilizam como algoritmos de controle órbita e atitude. Os sensores são os “olhos” do sistema e definem a precisão geral do controle. Alguns tipos englobam sensores solares (analógicos, digitais, CCD), terrestres (equilíbrio térmico, scanner horizontal), estelares (“star trackers”). O sensor estelar, por exemplo, é uma unidade de referência estelar que navega com base na posição das estrelas. Ele detecta estrelas em seu campo de visão e as compara com seu catálogo a bordo, que contém milhares de estrelas. Ele é adequado para pequenos satélites, nos quais a precisão de apontamento não é uma preocupação maior.

O controle de atitude também pode ser categorizado de acordo com o tipo de controle de torque, utilizado para alterar o momento angular do veículo espacial. O momento angular é a principal ferramenta utilizada para atingir controle de atitude. Ele altera o momento de inércia do veículo. Momento de inércia é a tendência de um corpo sólido de resistir forças de rotação (análoga à massa). Se um torque for aplicado por um determinado intervalo de tempo, o momento angular do corpo sofrerá alteração ao torque aplicado. Se não for aplicado nenhum torque, o momento angular do corpo permanecerá inalterado. O momento angular tende a permanecer inalterado os torques aplicados forem pequenos. Nesse caso, o eixo de rotação permanece fixo no espaço.

O centro de controle envia instruções ou comandos para produzir efeitos no veículo espacial ou foguete, por meio de atuadores. O sistema responde dinamicamente a essas instruções e essas respostas são mensuradas por meio de sensores. As informações obtidas por tais sensores são utilizadas pelo centro de controle para gerar sinais de controle. Alguns tipos de atuadores:

  • Propulsores: jatos de gases controlam a atitude do satélite. Eles são utilizados para aquisição inicial, ajuste de atitude durante manobras orbitais, geralmente em combinação com rodas de reação. Atingem amplos torques.

  • Rodas de reação ou de momento: são utilizadas para controle de rotina da orientação do veículo espacial. Quando um motor acelera a roda, o veículo espacial começa a rotacionar na direção oposta. A desaceleração das rodas possui o efeito de rotacionar o veículo espacial de volta. Ao dirigir as rodas em várias combinações, utilizando computadores para controle de atitude, podemos apontar o veículo na direção desejada.Veja na ilustração abaixo exemplo de rodas de reação.

A correção de atitude deve ser feita para que a missão atinja seus objetivos específicos de coleta de informações. Assim, as exigências de precisão de apontamento em um sistema de atitude é o principal elemento do desempenho de um sistema de controle de atitude. Finalmente, um mesmo veículo espacial pode combinar vários sensores e atuadores, dependendo dos instrumentos científicos que ele traz a bordo, dos tipos e quantidade de manobras necessárias, da periodicidade da execução dessas manobras, da necessidade de manter antena apontada em uma dada direção, dentre outros.

Síntese
 
  • Um veículo espacial requer sistema de controle orbital: conduz o veículo aonde ele precisa ir, ao longo de sua trajetória
  • A função de navegação determina a posição e velocidade corretas do veículo espacial no espaço inercial
  • A função de trajetória computa comandos para colocar o veículo na posição desejada
  • Um veículo espacial requer sistema de controle de atitude
  • Há dois tipos de controle de atitude e estabilização: spin e três eixos
  • A estabilização em três eixos pode ser ativa ou passiva
  • A estabilização requer sensores e atuadores
  • Os sensores são os “olhos” do sistema e informa onde o veículo espacial está, qual a sua orientação no espaço
  • Exemplo de sensor é o estelar (star tracker)
  • Por meio dos atuadores a atitude e a trajetória do veículo espacial pode ser corrigida
  • Exemplos de atuadores: propulsores e rodas de reação

Referências:

Dinâmica de atitude: http://www2.dem.inpe.br/val/projetos/atdyn/index.html
Satellite Times: http://celestrak.com/columns/v04n09/
Basics of Space Flight: http://www2.jpl.nasa.gov/basics/index.php
 
 

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